Uma linguagem própria dos símbolos foi sendo desenvolvida e aceite até aos nossos dias, desde que o homem sentiu necessidade de comunicar. As mais antigas formas de comunicação documentadas terão a sua origem na arte rupestre. Desde então até à actualidade não parou o homem de desenvolver a arte de melhor comunicar, chegando a criar códigos para que os não destinatários não pudessem entender a mensagem.Vista como uma crença envolta em superstições e contra a religião do estado, a fé professada em Cristo pelos primeiros cristãos valeu-lhes uma impiedosa perseguição, o que os levaria a ir passando as suas mensagens pelo uso de acrósticos(1), acrónimos(2) e por outro tipo de codificação como os monogramas e os símbolos, neles ocultando a sua identidade de cristãos. Essa perseguição foi particularmente sentida na segunda metade do séc. I, com Nero no poder, e com Diocleciano no início do séc. IV, instigado por Galério, um de seus tetrarcas.A desfavorável situação político-religiosa que sobre os cristãos recaía, levou-os a formas de comunicação próprias de grupos marginais que vivem na clandestinidade. Desses registos, talvez o mais conhecido seja o acróstico ICTUS(3). Estas letras do alfabeto grego eram dispostas verticalmente, de forma a que cada uma fosse a inicial em cada linha ou parágrafo. Assim, a palavra peixe, que é o que ICTUS quer dizer em grego (no grego antigo), significava as iniciais de Iesus Christos Theou Uios Soter, que quer dizer, Jesus Cristo de Deus Filho Salvador (há autores que dizem de maneira diferente: Jesus Cristo Filho de Deus e Salvador).Passando o acróstico a ser usado como um acrónimo, para dizerem Iesus Christos Theou Uios Soter, diziam simplesmente ICTUS, da mesma forma que nós dizemos apenas INEM quando queremos referir-nos ao Instituto Nacional de Emergência Médica, e dado que a palavra quer dizer peixe, então para simplificarem a mensagem, passaram simplesmente a desenhar um peixe.Outra forma utilizada eram os monogramas obtidos pelas letras (também do alfabeto grego) XP sobrepostas, como ainda hoje vemos nas nossas igrejas, que querem dizer as iniciais de CRisto (X = qui; P = rho, ou rô) e aquele outro que também já muito temos visto, o JHS = Iesus Hominun Salvator, que traduzido quer dizer, Jesus Salvador dos Homens.Apesar de as perseguições ao cristianismo terem acabado após Diocleciano com o imperador Constantino, por muito ter pesado até então nos cristãos o horror sentido pela infâmia da Cruz, só no séc. V - VI começaram a ver-se os primeiros crucifixos.Não obstante o próprio tempo decorrido e os progressos da Igreja nos mistérios de Deus sob a condução do Espírito Santo, há ainda hoje quem não entenda o fundamental do maior acontecimento da história da humanidade, o Mistério da crucificação do próprio Deus feito homem. Ultrapassado o choque de tal Acontecimento e começando a cicatrizar no coração dos cristãos a ferida causada pela infâmia da Cruz, recorreu a Igreja à imagem, propondo com ela a lembrança dos episódios mais marcantes na cristandade e para que ao mesmo tempo servisse como método pedagógico-catequético com vista a suscitar no cristão a contemplação da vida ou acontecimentos nela representados.Sob esse entendimento, enriqueceram-se os templos de valiosíssima arte iconográfica, a muitos deixando de “boca aberta” a perfeição, o requinte e a beleza das obras que tão bem retratam acontecimentos da vida de Jesus e dos santos. Templos há, em que o fiel é automaticamente remetido à sua pequenez, ao sentir-se reduzido pela imponência, majestade e beleza de toda a obra, onde tudo parece apelar e concorrer para a Majestade e Glória de Deus.Eloquentes catequeses conseguiram os artistas através das imagens. Quantas vezes já contemplámos obras tão perfeitas que nos fizeram escapar a expressão do nosso espanto, da nossa admiração? Quantas vezes já nos sentimos arrebatados pela realidade que a obra traduz? Quando assim acontece, é o sinal claro de que o artista conseguiu plenamente passar a mensagem pretendida através da imagem.O que vi há uns dias em Fátima, após a visita à nova igreja plantada no recinto do Santuário e sobre a qual já escrevi um outro artigo, leva-me a colocar ao leitor a seguinte questão:Quantos quadros tem nas paredes de sua casa que tenham apenas a moldura? Nenhum, certamente! Quantas fotografias traz na carteira, com o fundo todo em branco, sem que pessoa ou coisa alguma nelas se veja e com os dizeres: este é o meu pai; este é o meu filho; esta é a minha esposa, para que as pessoas a quem as mostra possam saber de quem se trata? Pois, estamos a falar do absurdo…Pois foi coisa do género que eu vi, num lugar onde não seria de esperar, num seminário. Num espaço que antecede a entrada para a igreja, onde entrei para participar na Santa Missa, deparei-me com algo muito semelhante, o que não causaria tanta surpresa se não se tratasse de um seminário e se não tivesse os tais dizeres…O “quadro” em questão, como que para que não restassem dúvidas, tinha a tal indicação, faltando porém o mais importante, que era a imagem da pessoa em causa. Os dizeres eram aqueles que Pilatos mandou colocar no instrumento último da Tortura do Próprio Deus.Na Igreja, o dom dos artistas sempre foi aproveitado para que a imagem tenha sobre nós o poder de nos ajudar a sentir a realidade representada. Porém, nos últimos tempos, se até os próprios seminários abriram as portas a uma “arte” completamente contrária a este princípio, como não havemos de sentir um incómodo vazio nos templos edificados no pós Vaticano II, onde não existe nada que favoreça a necessária atmosfera espiritual que nos envolve e nos eleva a um nível mais alto, ao sagrado?
(1) É uma forma poética de construir uma palavra ou uma frase, lendo na vertical as primeiras letras (ou outras) de cada parágrafo ou linha do texto. Como exemplo, nos três primeiros parágrafos deste artigo, encontramos o acróstico UVA.
(2) Conjunto de letras, pronunciado como uma palavra normal, formado a partir das letras iniciais. Exemplo: para dizermos Organização do Tratado Atlântico Norte, dizemos simplesmente OTAN.
(3) As letras do grego antigo são caracteres cujo formato não é possível aqui apresentar.
Extraído do blog: Idéias positivas(gandacaixa@gmail.com)
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